domingo, 9 de junho de 2013

Era madrugada...


Depois de um dia barulhento e corrido, cheios de buzinas, gritos de crianças, briga no apartamento ao lado, ônibus lotado, fila no supermercado, caras mal humoradas.. Clara chega em casa, sem fome resolve tomar banho e dormir. Dormir? Bem, era a ideia, mas em meio a um conflito interno o que conseguia era pensar. Pensar em como foi o dia, como foi corrido, cansativo, barulhento e solitário.
Era madrugada...
A solidão batia forte de tal maneira que fechar os olhos e imaginar uma multidão parecia mais acolhedor do que a realidade que rodeava o quarto tão cheio de móveis e tão vazio de afeto. Como era dificil encontrar um porto seguro onde pudesse desabafar as revoltas, contar como foi o dia, compartilhar as dores e multiplicar risadas.
Era madrugada...
E relembrava de quantos temporais em copo d'água  foram criados, de quantos "eu te amo" foram ditos e riscados no caderno, de quantas cartas foram queimadas, de quantas fotos foram rasgadas, de quantos sonhos foram deixados para trás porque pensava que nunca chegaria lá. Os filmes sempre são mais fáceis nessa hora. Mostram um começo sonhador, um meio difícil e um final com vitória. No entanto a realidade a aterrorizava.. Clara nunca entendeu o porque de tanto se sentir só e confusa, mesmo morando em uma grande metrópole. Era como se o mundo não tivesse cor, precisava de um ponto de partida para viver, se colorir por dentro e transbordar autoestima por fora.
Era madrugada...
E o que falar dos amores que se foram? Todos se tornaram estranhos depois da palavra 'acabou'. Aquele amor que não aconteceu, aquele amor passageiro, aquele amor tímido, aquele amor misturado com paixonites agudas,  aquele amor que não cansa de ser lembrado, aquele amor pelo professor, aquele amor pelo rapaz desconhecido do ônibus, aquele amor correspondido que acabou sem doer e o outro que doeu.
Era madrugada...
Sim, era madrugada e da janela dava para perceber que logo logo um novo dia iria surgir e  mais uma rotina começaria. Clara ainda não havia conseguido dormir, olhando as luzes lá fora fazia perguntas sem respondê-las, apenas questionava o silêncio sem se preocupar em respostas imediatas. Aquela frase "Tudo passa" se tornava mais forte naquela hora. Tudo isso passa, até aqueles momentos maravilhosos que imaginava lembrar todas as noites... Esse pensamento passa. Aí vinha outro pensamento mais forte e queria superar o anterior, aí passava de novo. Parece um ciclo sem fim em seu interior... mas tudo passa...até a madrugada passou.